Methodological principles of tactical periodization: a case study with a football coach of portuguese premier league.
RESUMEN COMUNICACIÓN/PÓSTER
The emergence of the tactical periodization in football has contributed to the diversification of the so far used methodologies in the preparation of the teams. This methodology is characterized by the convergence of different training dimensions, which organization lead to the tactical dimension. Just like other training theories, this present a set of fundamental assumptions and three methodological principles that legitimize the whole process.
The purpose of this study was to identify the configuration of the methodological principles of the tactical periodization in a specific training process.
In data collection we used the non-participant observation of a morphocycle applied by a football coach of the Portuguese premier league and we defined two variables of observation: game dimension, that include two aspects (the exercise complexity and the organization level), and the effort, that include five aspects (relational complexity, area, time, the session (des)continuity and the standard displacements). We also took notes of the coach talk at the end of the training sessions.
The data show that the process is global and requires a connection between methodological principles and between these and the tactical periodization assumptions, the specificity, the game model and the tactic. The methodological principle of the horizontal alternation is structured to allow a balance of the process. During the morphocycle, the game dimension is changed, followed by an adjustment of the required physical effort for the day. The horizontal alternation is only true when it promotes a progression of growing complexity. The tendency is defined taking into account that complexity and the desired alternation.
Introdução
As metodologias de treino aplicadas ao Futebol têm sido amplamente estudadas ao longo dos tempos, sendo que as linhas metodológicas exploradas têm sido múltiplas, como é o caso da periodização convencional (Matvéiev, 1991; Bangsbo, 1994) e do treino integrado (Castelo, 2004). Neste contexto a Periodização Táctica assume-se como uma das mais recentes, carecendo de ser estudada com maior profundidade. Para Frade (2004) esta metodologia apresenta linhas de operacionalização capazes de nortear o processo, de «treinar» para a construção do «jogar» futebol, de modo a que haja uma identificação coerente com o que se faz. Deste modo, o «princípio metodológico da alternância horizontal em Especificidade» é considerado como um possível ponto de partida, assumindo uma importância capital em relação aos restantes.
Segundo Gomes (2006) a orientação deste princípio metodológico aplica-se à dimensão «jogar» e, por consequência, à dimensão física. Já Oliveira et al. (2006) têm uma opinião distinta, ao mencionarem que existe uma ligação entre as duas dimensões no sentido do alterar as estruturas do treino ao longo do morfociclo semanal. As alterações têm início na dimensão física e, consequentemente, estendem-se a propósitos diferentes do «jogar», isto é, aos grandes princípios de jogo ou aos subprincípios de jogo.
O princípio metodológico da alternância horizontal em especificidade enquadra-se numa metodologia de treino muito particular, designada de Periodização Táctica que é, diametralmente oposta às demais. Ela assenta num paradigma holístico, não abstracto, portanto sistémico, segundo o qual, nos relembra que o todo pode ser mais do que a soma das partes e em que os sistemas complexos, como é o jogo de Futebol, podem ter propriedades emergentes que não podem ser observadas pela análise dos seus constituintes (McCrone, 2002; Varela, 2004; Kauffman, 2004).
Segundo Gaiteiro (2006), a periodização do treino, descreve um padrão de funcionamento no tempo. Esse padrão é constituído por duas características que se afiguram, superficialmente opostas mas profundamente interligadas. Se por um lado esse padrão evidencia invariâncias das grandes preocupações do jogar, organizado numa lógica de complexidade crescente, por outro, este processo é potenciado pela alternância horizontal do regime de contracção muscular dominante, segundo variáveis de tensão, duração e velocidade, desembocando em unidades de treino mais ou menos descontínuas. O mesmo autor refere que a alternância horizontal resulta do alternar o que é dominante de treino para treino. Assim, é horizontal porque é concebida numa lógica temporal, de um dia para o outro e não no mesmo dia. Apesar disso, Gaiteiro (2006) considera que, embora esta alternância aconteça horizontalmente ao longo do morfociclo semanal, também se pode encontrar verticalmente, na mesma unidade de treino, embora isso se constitua como um erro metodológico. Para o autor a alternância deve ser consumada entre sessões de treino e não entre exercícios da mesma sessão. A relação entre o desempenho/recuperação é conseguida através da alternância horizontal do nível de organização do «jogar», ou alternância em Especificidade. Desta forma, importa classificar as manifestações do «jogar», aglomerar e treiná-las por dias, permitindo que pela alternância do que se fez ontem, o que se faz hoje e o que se fará amanhã, as diferentes estruturas sujeitas ao esforço tenham a possibilidade de cumprir o período de regeneração.
Neste mesmo sentido, Mourinho (2006 inOliveira et al., 2006, p.101) revela que “a partir da segunda semana são ciclos semanais que se repetem. Logo a partir do segundo microciclo semanal da época, e estou a falar do período ao qual convencionalmente chamamos de período pré-competitivo, os microciclos são basicamente iguais até ao final da época. Quer ao nível dos princípios e objectivos de trabalho, quer em termos físicos. Só ao nível da dominante táctico-técnica é que vou fazendo alterações nos conteúdos a potenciar, em função das dificuldades sentidas no jogo anterior e daquilo que vai ser o próximo”. Gomes (2006) corrobora esta ideia ao assumir que o funcionamento repetido com o mesmo nível de organização, se promove uma relação esforço-recuperação incorrecta pois provoca uma sobrecarga das mesmas estruturas requisitadas. O mesmo autor considera ainda que não se pode cair no erro de considerar que a alternância horizontal se esgota apenas numa modificação do que é dominante numa unidade de treino para outra. Numa lógica de Especificidade, pese embora o regime dominante de contracção muscular deva ser diferente de uma sessão para a outra, há toda uma lógica que é invariante e que é o «jogar» da equipa. Este deve apresentar uma lógica de complexidade crescente ao longo das unidades de treino sem que isso represente uma modificação do que é dominante, concretamente ao nível da tensão, duração e velocidade das contracções musculares. Quando se reporta à necessidade de alternar, esta assenta numa perspectiva espácio-temporal em que o processo decorre. Esse espaço-tempo é delimitado por dois momentos de competição separados, de uma forma generalizada, por sete dias. A esse período espácio-temporal delimitado por dois jogos, denominado de morfociclo, repete-se ao longo das várias semanas, mantendo as estruturas próprias para cada dia, tendo sempre como ponto de referência o momento competitivo anterior e o seguinte.
O morfociclo configura-se sempre da mesma forma, contemplando sempre as mesmas dimensões do «jogar» em função do espaço-tempo desse período, variando apenas o conteúdo desse «jogar» ao longo da época. Neste sentido, e segundo Notalle (2004) é possível afirmar que essa natureza fractal do espaço-tempo, definida pelo morfociclo, é sempre sobre o mesmo, embora se possa alterar. Alteram-se os conteúdos de acordo com uma outra lógica mas a estrutura operacional do mesmo mantém-se. Só esta manutenção do morfociclo irá permitir a estabilização do rendimento do jogador/equipa, através da estabilização das estruturas que são requisitadas nos diferentes dias da semana. É nesta perspectiva de morfociclo que o princípio metodológico da alternância horizontal em Especificidade ganha sentido. Mantendo uma estrutura semelhante em cada morfociclo, há a necessidade de alternar os propósitos de modo a não sobrecarregar sempre as mesmas estruturas, mantendo uma relação entre desempenho e recuperação para que a segunda sirva a primeira, colocando o jogador/equipa num estado «óptimo» para cada treino e, principalmente, para cada jogo. O estado óptimo não é igual em todos e não é, necessariamente quantificável.
Gaiteiro (2006) considera que é a repetição sistemática que possibilita a automatização e faz emergir o papel do subconsciente enquanto parte activa para o «jogar» que se pretende. Por conseguinte, surge como ponto de partida lógico a associação entre o princípio da propensão à repetição sistemática e ao conteúdo do «jogar» que pretendemos evidenciar.
A “repetição sistemática” dos conteúdos, sejam eles de que escala forem, promove hábitos relativos à identificação do «jogar» pretendido nos diferentes momentos do jogo.
Tomando como referência as ideias que prevalecem acerca da Periodização Táctica e a necessidade de aprofundar o conhecimento acerca do modo como esta é colocada no terreno pelos práticos definimos a seguinte questão de partida: De que modo é que é operacionalizado o princípio metodológico da alternância horizontal em especificidade na Periodização Táctica? Partindo desta questão foi definido o seguinte objectivo: Identificar a configuração dos princípios metodológicos da Periodização Táctica num morfociclo semanal de um processo de treino específico.
MATERIAL Y MÉTODOS.
Caracterização do caso
O treinador (que passará a ser denominado de Bruno) foi seleccionado de forma não aleatória, representando um caso específico extraído do universo de treinadores passível de serem estudados. Deste modo, o caso seleccionado é representativo do universo em estudo (Heinemann, 2003), dado ser um treinador que utiliza a Periodização Táctica. Acresce que, o treinador é objecto de referência em trabalhos académicos, como sendo um dos que partilha desta concepção metodológica do «treinar» futebol (e. g. Carvalhal, 2001; Oliveira, 2004; Gomes, 2006; Oliveira et al., 2006). O treinador Bruno é licenciado em Desporto e Educação Física, com especialização em Alto Rendimento – Futebol, pela Faculdade de Desporto da Universidade do Porto. Tem um passado desportivo como jogador profissional de futebol e, como treinador, conta com passagens pelo Sporting Clube de Espinho, Sport Club Freamunde, Futebol Clube Vizela, Clube Desportivo das Aves, Leixões Sport Club, Vitória Futebol Clube (Vitória F. C.), Clube Futebol “Os Belenenses”, Sporting Clube de Braga, Sport Club Beira-Mar, Asteras Tripolis, Sport Club Marítimo e Sporting Clube de Portugal. Do seu palmarés como treinador é vencedor da Taça da Liga de Portugal (Carlsberg Cup®), finalista vencido da Taça de Portugal, segundo classificado da II Liga com consequente subida de divisão para o escalão principal, campeão da II Divisão B na época e participações nas competições europeias – Taça UEFA e Liga Europa.
Procedimentos de recolha
Para a recolha dos dados recorreu-se à observação estruturada não participante de um morfociclo do Vitória F. C., sob a responsabilidade do treinador Bruno. O período de observação decorreu entre os dias 21 e 27 de Outubro de 2007. Este período, em coerência com o ciclo de tempo que baliza um morfociclo, foi definido por dois jogos da referida equipa, o primeiro que opôs o clube ao Sport Lisboa e Benfica, um jogo para os quartos de final da Carlsberg Cup® e um segundo jogo entre o Vitória F. C. e o Futebol Clube Paços de Ferreira, correspondente à 8ª jornada da Bwin Liga® (I Liga Portuguesa). A observação decorreu em dois locais diferentes mas ambos na cidade de Setúbal (Portugal). Nos dias 22, 23 e 24 de Outubro de 2007 ocorreu no campo da Várzea e nos restantes dias o local foi o estádio do Bonfim.
Para a observação foram definidas duas variáveis, cada uma com diferentes indicadores. Como variáveis foram consideradas a dimensão do jogar e o esforço. No que respeita à dimensão do jogar definiram-se como indicadores: . o nível de organização do exercício referenteà complexidade do «jogar», isto é, aquilo que o exercício requer na quantidade e conteúdo das acções (grandes princípios de jogo ou subprincípios). . a complexidade do exercício definida pelo número de jogadores e/ou pelas condicionantes aplicadas no mesmo. Já na variável esforço, os indicadores definidos foram: . a complexidade relacional, sendo definida pelo número de jogadores na própria equipa e efectido de jogadores em oposição; . o espaço e o tempo de exercitação, determinado pela área em que o exercício decorre e pelo volume temporal atribuído, contemplando o tempo (em minutos) de exercitação e o de repouso; . a (des)continuidade intra e inter exercícios, indicador reconhecido através da quantidade de interrupções atribuídas no mesmo exercício e entre exercícios; . o padrão de deslocamentos define o padrão de solicitação muscular e a intervenção do treinador (como indutor de maior ou menor exigência concentracional e aplicacional ao jogador) e que passa pela percepção do observador em catalogar a velocidade dos deslocamentos, a sua duração e a sua tipologia predominante (rectilíneos, em curva, com acelerações/desacelerações, com quedas e/ou saltos) relacionados com uma maior ou menor participação do treinador.
Foram ainda efectuadas notas escritas decorrentes dos momentos de diálogo com o treinador Bruno, que ocorreram antes ou depois dos treinos. Esta recolha funcionou como complemento à observação, permitindo uma informação mais completa sobre os objectivos dos exercícios e respectiva fundamentação.
Procedimentos de análise
O registo do conteúdo observacional referente à operacionalização do morfociclo do Vitória F. C., desenvolvido pelo Bruno, foi efectuado numa ficha de observação para cada unidade de treino. A ficha de observação contemplava, para cada exercício, os indicadores que circunscrevem as variáveis implicadas no princípio metodológico da alternância horizontal em Especificidade. A análise de conteúdo foi a técnica utilizada na leitura dos dados oriundos das observações e das notas escritas.
Apresentação e Discussão dos Resultados
Partindo da questão inicial e tendo como base as variáveis definidas procurou-se identificar o modo como o treinador Bruno operacionaliza o seu modelo de treino, servindo-se dos princípios metodológicos da periodização táctica.
Relativamente ao modo como Bruno concebe e operacionaliza o seu modelo de treino este refere que existe uma configuração do «treinar» em que esse processo não é um fim mas um meio para alcançar o «jogar». O «treinar» e a construção do «jogar» são acções do mesmo processo enquanto estrutura global. Oliveira et al. (2006, p.35) consideram que o Modelo de Jogo além de pessoal, único, determina “a imprescindibilidade de treinar sempre em função disso mesmo, ou seja, de subordinar todo o processo de treino ao «jogar» que se pretende”.
Neste contexto, Mourinho (2006 in Oliveira et al., 2006) refere que a organização táctica se sobredimensiona às preocupações técnicas, físicas e psicológicas (como a concentração), estas surgem por arrastamento e, como consequência. Já para Oliveira et al. (2006) é através de uma sistematização semanal que o processo ganha a estabilidade na busca, redundante, para a solidez do «jogar». São ciclos de treino que respeitam uma determinada ordem morfológica no eixo espaço-temporal mas que vai apresentando conteúdos diferentes semana após semana, consoante a resposta da equipa, que revelará as suas necessidades.
Desta forma, o morfociclo ganha especial importância nesta fase de operacionalização do processo pois é ele que, pelas suas características invariantes, vai permitir trabalhar sempre da mesma forma, modificando apenas os conteúdos. A propósito disto, Mourinho (2006 in Oliveira et al., 2006) refere que os seus morfociclos são basicamente iguais desde o segundo ao último da época. Os princípios que contempla, os objectivos e a dimensão física são inalteráveis, havendo apenas espaço para alterações nos conteúdos táctico-técnicos que têm que ser potenciados em função do jogo anterior e do próximo. São precisamente estes dois momentos que balizam cada morfociclo. Este balizamento verificou-se na estrutura dos treinos do treinador Bruno.
Mourinho (2006 in Oliveira et al., 2006, p.108) afirma que “a estruturação da sessão de treino e do que fazer em cada dia não está apenas relacionada com os objectivos tácticos, mas também com o «regime físico» a privilegiar, na medida em que se deve ter em conta, por exemplo, os aspectos da recuperação, nomeadamente no que diz respeito à proximidade ou não do jogo anterior e do próximo”. O treinador Bruno também revelou esta preocupação quando refere que, o último jogo realizado (contra o Sport Lisboa e Benfica) foi mais exigente que os demais e que os jogadores precisavam de mais tempo de recuperação. Facto que o levou a decidir que as duas primeiras sessões de treino, após este jogo, teriam que contemplar, além de outras questões, a recuperação. O seu morfociclo, depois de quase três dias de recuperação, configurou-se de modo a precaver, precisamente, esta dinâmica entre desempenho-recuperação para que no jogo seguinte a equipa estivesse próxima das suas capacidades máximas. Nesta situação concreta é perceptível que a alternância horizontal acontece para possibilitar um equilíbrio entre o desempenho e a recuperação. Já Mourinho (2006 in Oliveira et al., 2006) refere-se a esta alternância em termos de conteúdos tácticos e complementarmente à dimensão fisiológica.
Relativamente ao binómio desempenho-recuperação foi visível que o treinador Bruno, em função da exigência e intensidade do jogo e do desgaste correspondente, faz reajustamentos que se configuram à escala semanal, diária ou mesmo momentânea. Por conseguinte é o jogo que, semana após semana, que vai preencher o formato de cada morfociclo para que a relação desempenho-recuperação, principalmente ao nível da solicitação mental-emocional, seja equilibrada.
De seguida apresentam-se os resultados e respectiva discussão segundo uma ordem cronológica, isto é, desde o primeiro ao último dia do morfociclo semanal observado balizado por dois momentos competitivos.
O dia seguinte ao jogo – dia de recuperação passiva O dia destinado à recuperação passiva, o dia de descanso (dia seguinte ao jogo), foi o Domingo visto que o jogo se realizou no sábado. O treinador Bruno optou por uma recuperação passiva em detrimento de privilegiar uma recuperação activa que, segundo Bangsbo (1994), é tão mais eficaz quanto mais próximo do jogo estiver. Já Carvalhal (2001) corrobora a opção do treinador Bruno ao referir que a recuperação a que se reporta se prende com a necessidade de reequilíbrio da estrutura mental-emocional. Também Mourinho (2006 in Oliveira et al., 2006) diz que, numa lógica semanal sem jogos a meio da semana, opta pelo descanso no dia seguinte. Este considera que embora sob o ponto de vista fisiológico possa não ser o mais correcto, é-o do ponto de vista mental, pois sabe que os jogadores não gostam de treinar nesse dia nem se sentem bem.
Segundo dia após jogo – dia de recuperação activa Neste dia ainda com o objectivo de dar continuidade à recuperação, o treino teve uma reduzida exigência mental-emocional, isto é, não existiram exercícios que pudessem ser exigentes ao nível da concentração táctica. Uma das situações criadas foi o popular “meinho” (8×1) num espaço de 5 por 5 metros, este revelou-se simples e motivador. Em termos de esforço físico, o exercício não envolvia deslocamentos nem movimentos angulares acentuados dos segmentos corporais, apenas passes ao primeiro toque, portanto sem exigência relevante sob o ponto de vista fisiológico. O treino teve a duração de apenas cinquenta minutos, o que está em consonância com o período de tempo apresentado por outros treinadores para este dia do morfociclo (Oliveira, 2006).
Terceiro dia após jogo – primeiro dia aquisitivo O terceiro dia após o momento competitivo, considerado o primeiro dia aquisitivo, houve duas sessões de treino, sendo que na segunda sessão ainda foram propostas tarefas relacionadas com a recuperação. Este treino, para os jogadores que tiveram jogo no sábado, durou aproximadamente cinquenta minutos, sendo dispensados do último exercício. Bruno justificou a sua opção dizendo que os jogadores ainda estavam em processo de reequilíbrio neuromuscular. Ao nível do esforço físico, o treino foi muito descontínuo, com pausas entre cada repetição. As pausas equivaleram a metade ou a um terço do tempo de exercitação sendo que algumas foram para alongamentos e hidratação. O tipo de solicitação muscular oscilou de elevadas tensões e velocidades de contracção aquando da realização do exercício relativo a um subprincípio da transição ataque-defesa, para tensões e velocidades moderadas de baixa duração de contracção no exercício destinado ao subprincípio ofensivo. Comparativamente com o dia anterior, houve uma alteração dos propósitos relativos à dimensão do «jogar», passando de uma potencial ausência de conteúdos para alguns subprincípios de jogo, isto é, para uma pequena fracção da dimensão do «jogar». Sob o ponto de vista físico, os exercícios, pelas acções pretendidas, requisitaram contracções musculares com elevada tensão, velocidade e pouca duração. Relativamente ao treino do dia anterior, neste treino houve um aumento do desgaste emocional,
Quarto dia após jogo – segundo dia aquisitivo Neste quarto dia após o jogo, segundo dia aquisitivo, localizado no ponto mais distante de ambos os jogos que balizam o morfociclo (o jogo anterior e o próximo), o treinador Bruno contemplou na sessão de treino a grande fracção do «jogar» por recurso a dois exercícios que requisitaram os grandes princípios de jogo. Ao nível da complexidade dos comportamentos, verificou-se que estes foram mais complexos, porque requisitam um conjunto de subprincípios subjacentes a um grande princípio e, consequentemente, uma organização colectiva, onde a equipa teve de pensar e decidir de acordo com os princípios de jogo desenvolvidos. Nos exercícios houve um aumento do espaço, do número de jogadores e consequentemente conduzindo a níveis de complexidade superiores. O aumento do espaço permitiu responder às preocupações físicas para esse dia. A alternância entre a dimensão do «jogar» em espaços maiores, com um maior número de jogadores, exigiram um padrão de contracções musculares com diminuição da tensão e menor velocidade mas com um aumento da duração em relação ao dia anterior. Noutro exercício aumentou o espaço e acrescentou dois guarda-redes aos vinte jogadores que jogavam entre si durante dois períodos de dezoito minutos contínuos de exercitação. Com o aumento do espaço e pelo tipo de comportamentos requisitados, o padrão de contracção muscular definiu-se por ser menos tenso, menos rápido mas mais durável dado que os deslocamentos foram mais rectilíneos e com menos quantidade de acelerações/desacelerações.
Quinto dia após jogo – terceiro dia aquisitivo No terceiro e último dia aquisitivo segundo Gomes (2006) deve ser diferente do 1ª e 2ª dias aquisitivos, deve passar-se da grande dimensão do «jogar» para a pequena fracção do «jogar». Nesta sessão de treino foi visível uma diferenciação da dimensão do «jogar», dado que o treinador Bruno apenas considerou pequenas fracções do «jogar», isto é, pequenos subprincípios de jogo, como foi o caso da mobilidade entre médios interiores em organização ofensiva e as trocas posicionais entres os extremos e o avançado na última fase da organização ofensiva. Foi assim visível uma alternância entre os diferentes dias aquisitivos. Foi também notória a diminuição da complexidade dos exercícios. Em termos de esforço físico, o treinador Bruno propôs exercícios com espaço mais reduzido comparativamente ao dia anterior. Pelo tipo de movimentos realizados pelos jogadores, o padrão de contracção muscular apresentou maiores níveis de velocidade, tensão e menor duração, comparativamente ao dia anterior. Ao nível dos tempos de exercitação, os exercícios tiveram uma duração entre os seis e os trinta minutos. Nos primeiros dois exercícios houve interrupções por períodos correspondentes ao tempo total de exercitação, no exercício seguinte houve quatro períodos de repouso entre os 30 e os 60 segundos. Esta dinâmica entre exercitação e pausa tornou o treino bastante descontínuo. Esta descontinuidade é também referida por Oliveira et al. (2006).
O dia anterior ao jogo – recuperação pré jogo Neste dia o treinador Bruno promoveu um exercício lúdico, desprovido de preocupações em termos da dinâmica do «jogar», a que se seguiu um exercício de 10×0+guarda-redes cujo objectivo era a recapitulação de comportamentos que teriam de ser exacerbados em jogo face às características do adversário que se seguiria. Ao nível da exigência mental-emocional esta foi reduzida, bem como a exigência física. Este treino teve muitas pausas que, por vezes, foram superiores aos períodos de exercitação.
No morfociclo semanal conduzido pelo treinador Bruno foi notória uma alteração dos níveis de complexidade.
Conclusões
O treinador Bruno parte de um entendimento de táctica como forma de acesso principal ao processo do «treinar» e do «jogar». Este rege o seu modelo de treino pela Periodização Táctica recorrendo aos três princípios metodológicos que legitimam e direccionam os morfociclos semanais, isto é, à alternância horizontal em especificidade, à progressão complexa e ao princípio das propensões. O morfociclo padrão, configurado numa lógica semanal com determinados propósitos, assumiu-se como a fonte de estabilização do processo.
Relativamente à configuração dos princípios metodológicos da Periodização Táctica no morfociclo semanal foi visível que o princípio metodológico da alternância horizontal, que assenta na necessidade de equilibrar a relação entre desempenho e recuperação, foi operacionalizado ao longo do morfociclo por recurso à alteração da dimensão do jogar ao longo dos dias da semana. Associada a esta alteração ocorreram outras ao nível da dimensão esforço (relacionada com os atributos fisiológicos). Houve descontinuidade do treino no que concerne ao tipo de contracções musculares, que são fundamentais para que a dimensão do jogar considerada em cada dia da semana. Acresce que, não ocorreu apenas um equilíbrio entre desempenho-recuperação ao nível das estruturas mentais-emocionais, mas também ao nível das estruturas fisiológicas. A duração dos exercícios, os tempos de recuperação e a sua quantidade, o espaço contemplado e o número de jogadores em cada exercício foram formas da dimensão esforço regular o processo, em dependência com a dimensão do jogar definida para esse dia.
No dia mais afastado dos dois momentos competitivos, que balizam o morfociclo, treinaram-se os grandes princípios de jogo, porquanto estes promovem um maior desgaste mental-emocional e físico.
Verificou-se que existe uma dimensão do «jogar» diferente do primeiro dia ao último dia aquisitivo. Este princípio metodológico da periodização táctica cumpriu-se nesta variação mas não se esgotou nela. A alteração do padrão de contracção muscular também se revelou um factor importante no equilíbrio do processo.
O princípio metodológico da alternância horizontal e o princípio metodológico da progressão complexa estiveram em conexão, isto é, para passou-se do menos para o mais complexo de forma doseada, equilibrada.
O facto do estudo se ter reportado apenas a um morfociclo constitui-se uma limitação. A observação de três morfociclos, descontínuos no tempo, seria importante para melhor responder à questão de partida.
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