Coaches’ representations about the quality of coach education programs in Portugal according to their academic education level.
The purpose of this study was to analyze the coaches’ representations about the quality of national coaching certification programs and the value awarded to the pedagogical strategies in continuum education, according to their academic education level.
Resumen
The purpose of this study was to analyze the coaches’ representations about the quality of national coaching certification programs and the value awarded to the pedagogical strategies in continuum education, according to their academic education level. Three hundred and thirty-six Portuguese coaches from different sports participated, to whom a questionnaire was given after construction and content validation. Statistics descriptive and inferential tests through the One-Way ANOVA and Tukey HSD Post Hoc were applied.
Coaches evaluated the coach education programs between sufficient and good, highlighting the little time conceded to the practical component whereas the knowledge of the trainers was emphasized regardless the coach’s academic education level; only in variable model of evaluation coaches with higher education in Physical Education evaluated this item more positively.
In terms of continuum education strategies, the coaches pointed out the strategies which are situated mainly on the metaphor of participation, including formal, non formal and informal learning situations, that shows the importance of considering them in coach education programs. The coaches with an academic background in Physical Education and Sports valued more the need for expert counseling.
Introdução
Com o incremento da popularidade do Desporto, a qualificação dos seus intervenientes assume papel determinante, onde se destaca a formação dos técnicos, principais responsáveis pelo processo de formação dos desportistas (Woodman, 1993). Os treinadores são os primeiros a reconhecer a importância da formação qualificada, como factor propedêutico do sucesso nas práticas profissionais (Vargas-Tonsing, 2007), contribuindo, para tal, a investigação realizada neste domínio. Todavia, constata-se que a agenda da investigação no âmbito da formação de treinadores, tem focado, sobretudo, o desenvolvimento da performance, renegando as temáticas direccionadas para o próprio processo de formação dos treinadores (Cushion et al., 2003).
Os programas de formação de treinadores emergiram apenas nos últimos 30 anos, encontrando-se no momento actual em fase de franco desenvolvimento (Gilbert & Trudel, 1999). Estes programas ainda que consubstanciem linhas orientadoras específicas, apresentam limitações negligenciadoras, não raramente, das reais necessidades dos treinadores (Roy & Villeneuve, 2002). De facto, a investigação assente no estudo da formação de treinadores tem indagado acerca da parca transferibilidade dos conteúdos abordados nos cursos de treinadores para a prática (Jones et al., 2003), ao que não é alheio os métodos e estratégias de ensino aplicadas. Esta situação é extensiva aos cursos de certificação de nível e à formação contínua, sendo que esta última deve estar presente durante toda a carreira do treinador (Wenger, 1998).
De forma a sistematizar o estudo sobre os processos formativos, Nelson et al. (2006) consideram três situações de aprendizagem: formais, informais e não formais. As situações formais englobam todo o processo habitualmente inserido em currículos estandardizados, como é o caso dos programas de certificação de nível, onde os formandos têm de evidenciar a aquisição de conhecimentos para obterem a certificação. As situações não formais ocorrem em actividades como seminários e clinics, consideradas actividades educativas organizadas fora do sistema formal e que não conduzem à certificação de nível. As situações informais são auto-orientadas e são baseadas nas experiências profissionais, na prática do treino e em actividades relacionadas com o desporto. A complementaridade destas experiências desportivas permite ao treinador a aquisição de uma formação qualificada, congruente com a diversidade de problemas com que se depara na actividade que desenvolve.
De facto, a investigação neste domínio tem alertado que os programas actuais de formação de treinadores, em geral, não preenchem as necessidades dos treinadores (Gilbert & Trudel, 2006). A formação adquirida em situações formais representa apenas uma pequena parcela do complexo processo de aquisição e desenvolvimento das competências do treinador e, consequentemente, do incremento da sua expertise (Erickson et al., 2007; Nelson & Cushion, 2006). Para além disso, as situações formais utilizadas vulgarmente não consideram a natureza complexa e dinâmica da actividade do treinador, dado que (i) as sessões decorrem em salas de aula, sem se ter em conta o contexto de treino; (ii) habitualmente as formações são de pequena extensão e ocorrem em regime intensivo; (iii) existe uma discrepância entre a matéria prevista e a que é efectivamente transmitida (Gilbert & Trudel, 2001). No que respeita aos conteúdos abordados, Luikkonen et al. (2006) advogam que as disciplinas consignadas curricularmente nos cursos de formação de treinadores, orientam-se sobretudo para disciplinas bio-científicas, focando pouco as ciências humanas e sociais como a pedagogia e a psicologia.
Estas limitações são evidenciadas por Vargas-Tonsing (2007), num estudo aplicado a treinadores em formação contínua, os quais salientam a insuficiência de conteúdos e a inadequação das estratégias e métodos utilizados, para fazer face às necessidades reais da actividade profissional. Treinadores experientes corroboram esta ideia e embora confiram importância aos programas de formação pelas oportunidades que geram através da interacção entre treinadores de experiências distintas, não deixam de apontar lacunas ao nível do tempo dedicado às aplicações práticas em situação de treino em detrimento das sessões teóricas (Salmela, 1996).
Assim, os programas de formação de treinadores, quer nos cursos de certificação de nível quer na formação contínua, por privilegiarem situações de aprendizagem formais situam-se na Metáfora de Aquisição (Sfard, 1998, citado por Erickson et al., 2008), a qual se baseia na transmissão de informação aos treinadores, de forma a esta ser adquirida e aplicada nos seus próprios contextos.
Embora sejam identificados alguns benefícios das situações de aprendizagem formais, outras formas de aquisição de conhecimentos e competências foram identificadas pelos treinadores (Erickson et al., 2008). A aprendizagem pela experiência em treino, pela reflexão da prática, o acompanhamento de treinadores experientes, o apoio individualizado na prática do treino por um treinador experiente e o aconselhamento especializado (os quais se inscrevem no processo de mentoria), são algumas das vias consideradas como potenciadoras do desenvolvimento da expertise dos treinadores (Bloom et al., 1998; Lyle, 2002). Estas estratégias formativas inscrevem-se na designada metáfora de participação (Sfard, 1998, cit. por Erickson et al., 2008) e priorizam a interacção, reflexão e participação em actividades partilhadas com outros treinadores (ex: comunidades de prática), favorecendo o enriquecimento do processo formativo.
Em Portugal, a formação correspondente aos cursos de certificação de nível caracteriza-se por apelar prioritariamente a situações de aprendizagem formais, as quais se incluem na metáfora de aquisição (Mesquita & Rosado, 2009).Neste sentido, importa estudar a representação de treinadores em Portugal, acerca da qualidade dos cursos de certificação de nível, no referente às estratégias pedagógicas, conteúdos e regime de funcionamento, bem como às estratégias de formação contínua, atendendo à sua relevância na sustentação de conhecimentos e competências ao longo da carreira profissional.
Dada a classe profissional dos treinadores apresentar, comummente, uma diversidade considerável na formação académica que ostenta, e sendo que esta mostra interferir no nível de conhecimentos alcançado (Rupert & Buschner, 1989), reconhece-se a importância de perceber em que medida a avaliação da qualidade dos cursos de formação frequentados pelos treinadores varia, em função desta variável demográfica. Neste âmbito, importa ainda diferenciar a formação superior em Educação Física e Desporto das outras formações superiores, dada a primeira ser considerada uma fonte de conhecimento fundamental na construção da expertise (Bloom, 1997; Demers et al., 2006), ao conferir um alargado suporte teórico de conhecimentos (Bloom, 1997; Demers, et al., 2006), particularmente, ao nível das questões didácticas e da formação de treinadores (Bloom, 1997).
Baseado neste enquadramento teórico é propósito do presente estudo avaliar a representação de treinadores em Portugal, relativamente à qualidade dos cursos de certificação de nível em função da grau e da tipologia da sua formação académica. Este trabalho tem ainda como intenção perceber em que medida os treinadores valorizam as estratégias pedagógicas na formação contínua em função das mesmas variáveis apresentadas anteriormente.
Métodos e procedimentos
Amostra
Participaram neste estudo 336 treinadores portugueses, dos quais 284 do sexo masculino e 52 do sexo feminino, com uma média de idades de 32.25±9.78, provenientes de vinte e duas modalidades. No entanto, apenas 61.3% dos treinadores (n=206) frequentaram cursos de certificação de nível e de formação contínua, o que conduziu a uma restrição dos sujeitos efectivos da amostra. Este grupo de treinadores apresenta uma experiência profissional média de 8.34±8.56 anos. Relativamente à variável independente em estudo, formação académica dos treinadores, os participantes dividiram-se nos seguintes grupos: escolaridade até ao 12º ano, 137 treinadores (40.2%); formação superior em Educação Física e Desporto, 157 treinadores (45.8%) e 42 treinadores (11.9%) com formação superior noutras áreas. Neste último grupo, os treinadores possuíam uma ampla gama de cursos: economia, psicologia, gestão, ciências agrárias, biologia e estudos militares, não relacionados na sua maioria com cursos das áreas da educação.
Recolha de dados e instrumento
Neste estudo foi aplicado um questionário constituído por duas partes, sendo que a primeira refere-se à informação demográfica e a segunda à avaliação da qualidade dos cursos de formação de treinadores, mormente das estratégias pedagógicas, conteúdos e regime de funcionamento, bem como das estratégias de formação contínua. Esta parte do questionário foi objecto de validação de construção por meio da consulta da literatura da especialidade (Erickson et al., 2008; Wright et al., 2007), seguida da validação de conteúdo a qual comportou duas fases. Na primeira, o questionário foi revisto por um grupo de três peritos (doutores em Ciências do Desporto, especialistas nesta área de investigação, e com experiência como treinadores), que procedeu à actualização de alguns dos itens presentes no questionário original, tornando este mais adequado. Na segunda fase, para a verificação da objectividade clareza e inteligibilidade das questões, foi realizado um estudo piloto com a participação de 30 treinadores de diversas modalidades e escalões de prática e, ainda, com diferentes níveis de experiência.
A versão final do questionário ficou composta por vinte e seis itens. As respostas do questionário foram avaliadas numa escala de Likert de quatro itens (1 a 4) para as perguntas relativas aos cursos de certificação inicial (1-insuficiente, 2-suficiente, 3-bom e 4-muito bom) e de cinco itens (1 a 5) para as estratégias de formação contínua (1-sem importância, 2-pouca importância, 3-importância razoável, 4-grande importância e 5-muito grande importância). Relativamente aos cursos de certificação de nível, dado a perda de memória de acontecimentos antigos ser uma possibilidade (Estes, 1994) e, por isso, as respostas puderem não ser verosímeis, optou-se por situar as perguntas no último curso que os treinadores realizaram.
O preenchimento dos questionários teve lugar em congressos e seminários relacionados com a formação de treinadores. Foi obtida uma declaração de consentimento livre e esclarecido, sendo garantido o anonimato dos voluntários para preenchimento do questionário. Os objectivos do estudo foram explicados previamente ao preenchimento do questionário. A duração do preenchimento situou-se entre os 10 e os 25 minutos.
Análise de dados
Para a análise quantitativa dos dados utilizou-se a estatística descritiva a fim de calcular medidas de tendência central e dispersão, médias e desvios-padrão (DP), respectivamente. Os requisitos da normalidade foram garantidos pelo teste de Kolmogorov-Smirnov e os da homogeneidade das variâncias pelo Teste de Levene’s. Para o estudo dos dados em função da formação académica dos treinadores aplicou-se o teste One-Way ANOVA e o teste de Tukey HSD para os testes a posteriori. O nível de significância foi mantido a 0.05 (valor de p).
Resultados
Constata-se que os treinadores em relação ao último curso de certificação de nível que realizaram classificaram de bom o nível pedagógico dos formadores, com valores de 2.91±0.83 e o nível de conhecimentos dos formadores (3.08±0.82) (Quadro 1). Por outro lado, a duração da componente prática obteve a classificação mais baixa de todos os itens (2.26±0.97), situada no suficiente, seguida das estratégias pedagógicas (2,39±0.85). Se por um lado, nenhum dos itens foi avaliado como insuficiente, também a classificação de muito bom nunca foi atribuída. Assim sendo, os treinadores avaliaram o último curso de certificação de nível em que participaram entre suficiente e bom, o que sugere a existência de alguma insatisfação dos treinadores perante a formação que obtiveram.
Quadro 1: Representação dos treinadores em relação à qualidade do último curso de Certificação de Nível que realizaram.
No que se refere às estratégias de formação contínua consideradas, os treinadores atribuíram grande importância a todos os itens, com valores médios acima dos 3.5, isto é, acima de uma importância razoável (Quadro 2). Contudo, destaca-se a maior importância atribuída à formação contínua obrigatória (3.98±0.90), à inclusão de clinics (3.97±0.78), bem como de seminários (3.90±0.82).
Quadro 2: Representação dos treinadores em relação à valorização das estratégias de formação contínua.
Na avaliação do curso de certificação de nível em função da formação académica (Quadro 3)., verificou-se que apenas no modelo de avaliação, o grupo de treinadores com outras formações superiores avaliou mais negativamente este aspecto, relativamente aos treinadores com formação superior em Educação Física e Desporto (p?0.05).Assim sendo, enquanto os treinadores com formação superior em Educação Física e Desporto classificaram os modelos de avaliação entre suficiente e bom (2.59±0.74), os indivíduos com outras formações superiores atribuíram-lhes suficiente (2.06±0.68).
Quadro 3: Representação dos treinadores relativamente ao Curso de Certificação de Nível em função da formação académica.
A análise das estratégias de formação contínua em função da formação académica dos treinadores evidenciou diferenças estatisticamente significativas apenas ao nível da categoria aconselhamento especializado (p=0,045) (Quadro 4). Os treinadores com formação superior em Educação Física e Desporto classificaram mais positivamente este item, quando comparados com os treinadores com formação até ao 12º ano, sendo que os últimos vêem esta variável como a menos importante entre as estratégias de formação contínua.
Quadro 4: Representação da valorização das Estratégias de Formação Contínua, em função da formação académica.
Discussão
Qualidade do Último Curso de Certificação de Nível
Na avaliação do último curso de certificação de nível, a duração componente prática foi consideradaapenas de suficiente, corroborando a ideia da reduzida importância conferida à prática nos cursos de formação (Roy & Villeneuve, 2002). Do mesmo modo, Ibáñez et al. (1997) no seu estudo com 355 treinadores de Basquetebol, referem que embora exista uma boa opinião relativamente à competência dos formadores, as metodologias de abordagem dos conteúdos são consideradas pelos formandos demasiado expositivas, descurando-se a possibilidade de interacção e de discussão, características das situações práticas. Diferentes estudos (Gilbert & Trudel, 1999; Gould et al., 1990) evidenciam a importância da valorização das situações práticas de aprendizagem, uma vez que contribuem, não só para uma melhor aquisição dos conhecimentos aprendidos, como também permitem a contextualização dos mesmos traduzindo-se numa melhor aquisição de competências práticas.
Por seu turno, o nível pedagógico e de conhecimento dos formadores foram classificados de bom, sugerindo que os treinadores em formação estão relativamente satisfeitos com as valências pedagógicas e de domínio dos conteúdos dos formadores. Estes resultados diferenciam-se ligeiramente dos encontrados por Resende et al. (2007) num estudo aplicado a treinadores de Voleibol, onde os treinadores quando inquiridos sobre o nível pedagógico e de conhecimentos dos prelectores atribuíram valores entre bom e muito bom respectivamente. Estes aspectos são sobremaneira importantes na formação de treinadores, na medida em que é do entrelaçamento do conhecimento dos conteúdos de treino com os procedimentos pedagógicos e, em particular, didácticos, que são optimizados os processos instrucionais (Mesquita & Graça, 2009). Todavia, a ausência da classificação de muito bom, em qualquer um dos itens, sugere que os treinadores não estão totalmente satisfeitos com os programas de formação em vigor, indiciando a necessidade de se realizar investigação qualitativa capaz de descortinar especificamente e de forma contextualizada os motivos geradores desta situação.
O facto de apenas se revelarem diferenças significativas em função da formação académica num dos itens, modelo de avaliação, é elucidativo da consistência e estabilidade da avaliação dos treinadores, porquanto o nível de habilitações literárias, aspecto que pode criar clivagens culturais e intelectuais entre os indivíduos, não diferenciou os treinadores. Mais se acrescenta que ao nível do modelo de avaliação, a constatação de que os treinadores com formação académica em Educação Física e Desporto mostraram estar mais satisfeitos que os treinadores com outras formações superiores, pode encontrar explicação no facto dos últimos não possuírem conhecimentos desta área, usualmente tratada nos cursos de Educação Física e Desporto. À semelhança do apontado anteriormente, a realização futura de estudos de natureza qualitativa permitirá elucidar acerca das razões que explicam esta dissemelhança entre os dois grupos.
Estratégias de Formação Contínua
Os treinadores do presente estudo valorizaram em primeiro lugar a formação contínua obrigatória, a participação em clinics e também em seminários com convidados especialistas, indo ao encontro de algumas das estratégias de formação contínua enunciadas como relevantes pela literatura (Gould et al. 1990; Lyle, 2002; Rosado & Mesquita, 2008; Salmela, 1996).
Num estudo realizado por Gould et al. (1990) aplicado a 130 treinadores de elite participantes nos Jogos Pan Americanos, os autores aferiram que para os treinadores é determinante da evolução na carreira, a participação sistemática em seminários e clinics. Estes autores ainda referem que, no sentido de melhorar a formação contínua de treinadores, a educação formal deve estender-se aos contextos de prática pedagógica, ou seja, estágio profissionalizante, suportada pelo acompanhamento de mentores. O estudo de Bloom et al. (1995) realizado com 21 treinadores experts de várias modalidades, evidenciou do mesmo modo a necessidade de se enfatizar os clinics, seminários e simpósios, a experiencia prática e, como prioritário, um programa de mentoria.
Diferentes estudos demonstram a importância da convergência de distintas estratégias formativas no quadro da formação do treinador de Desporto. Afonso, Graça & Mesquita (2003) num estudo de caso com quatro treinadores de escalões de formação de Voleibol, com formação universitária, verificaram que os mesmos reconhecem como prioritárias, as seguintes fontes de conhecimento na sua formação profissional: o conhecimento adquirido no ensino superior; a experiência prática no terreno; o contacto com treinadores experts; a mentoria; o auto-estudo e a experiência prática resultante da troca de informação com os seus pares. Irwin et al. (2004) num estudo de caso com seis treinadores de elite de Ginástica, concluíram que os treinadores recorrem às fontes de conhecimento para aprender a treinar e que a aquisição do conhecimento provém em grande medida da interacção com outros treinadores em seminários/clinics e acções de mentoring, nas quais se exercita a prática reflexiva, a discussão entre pares em ambientes que adoptam contornos de comunidades de prática.
Num estudo desenvolvido por Jones et al. (2004) com treinadores de elite de desportos individuais, oriundos de Inglaterra, Nova Zelândia e Austrália, pretendeu-se perceber as percepções destes acerca dos factores situacionais, contextuais e experienciais que mais têm contribuído para a sua formação e actuação prática. Pode-se verificar que as observações e/ou discussões com outros treinadores, mais e menos experientes, assumiram maior importância naquilo que mais contribui para o nível atingido enquanto treinadores, ultrapassando a percepção do efeito dos cursos de formação.
Em França, Fleurance e Cotteaux (1999) realizaram um estudo com 10 treinadores experts averiguando de que forma estes desenvolveram a sua expertise. Os resultados mostraram que os treinadores consideram importantes: os cursos de certificação de nível; a prática como atleta; a prática profissional; a mentoria; a interacção com atletas de alto nível; a formação contínua e o investimento pessoal na formação. Reforçam ainda que, embora tenham sido os programas de certificação que lhes auxiliaram a dar o primeiro passo enquanto treinadores, foi a experiência durante a sua prática que contribuiu para o desenvolvimento da sua expertise.
Deste modo, o recurso a situações de aprendizagem informais em complementaridade com as situações de aprendizagem formais fornece um quadro mais amplo e suportado de formação onde a metáfora de aquisição e de participação coabitam no sentido de complementar teoria e prática, cognição e acção. Esta complementaridade urge ser implementada mormente em Portugal onde os programas de formação de treinadores tradicionalmente não integram o estágio profissionalizante na formação de certificação de nível, ou seja, a aprendizagem experiencial em contextos reais de treino. Tal situação é apenas considerada no contexto da formação de treinadores em sede de sistema universitário onde o estágio profissionalizante faz parte da formação do treinador em complemento da formação teórica (Mesquita & Rosado, 2009).
De facto, os indivíduos com formação superior em Educação Física e Desporto valorizam mais a variável aconselhamento especializado do que os indivíduos com formação até ao 12º ano. Tal sugere a importância conferida à mentoria na formação universitária, aspectos apontados na literatura como determinantes na aquisição de competências profissionais (Irwin, et al., 2005; Knowles et al., 2005).
Conclusões
Os treinadores na avaliação dos cursos de certificação de nível situaram todos os itens entre suficiente e bom, onde se destaca a duração da componente prática dos cursos que obteve a avaliação mais baixa e o nível de conhecimento dos formadores a mais elevada. Mais se acrescenta que apesar de nenhum dos itens ter sido avaliado como insuficiente, o facto é que também nenhum deles obteve a nota de Muito bom, o que elucida da necessidade de uma reflexão profunda e sustentada sobre a reformulação conceptual e operacional dos programas de formação de treinadores, nomeadamente em Portugal. Este entendimento foi partilhado pelos treinadores, independentemente do nível de formação académica o que atesta da consistência e estabilidade do entendimento dos treinadores a este nível.
Ao nível das estratégias de formação contínua, os treinadores apontaram como relevantes estratégias que se situam prioritariamente na metáfora de participação, relevando da importância de as considerar nos programas de formação de treinadores. Mais se acrescenta da importância conferida pelos treinadores à formação contínua obrigatória e à frequência regular, e sistemática de clinics e seminários, realidade pouco frequente na formação de treinadores, principalmente em Portugal. O reconhecimento destas estratégias sugere a importância de manter os conteúdos actualizados e de promover a actualização de competências profissionais ao longo de toda a carreira como requisito do alcance da expertise. Particularmente, o facto dos treinadores com formação em Educação Física e Desporto valorizarem mais a necessidade de ter um aconselhamento especializado, realça a consciência, de quem tem um conhecimento científico e pedagogicamente mais sustentado, em serem utilizadas estratégias na sua formação que gravitem em torno da interacção entre formadores e formandos, referenciadas aos aspectos específicos, particulares e idiossincráticos apanágio da actividade profissional do treinador.
A presente investigação apesar de apontar indicadores pertinentes para a formação de treinadores, levanta a necessidade de se realizarem estudos de outra natureza. Para o efeito urge recorrer a entrevistas e à observação de práticas no âmbito da formação de treinadores, de certificação de nível e contínua, capazes de fornecer um contributo mais sustentado e contextualizado sobre a temática e, com isso, fornecer indicadores valiosos para a qualificação da formação profissional do treinador.
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